Em busca de uma
Comissão da Verdade de verdade
Otávio Luiz Machado
*É educador,
pesquisador, escritor e documentarista. E-mail: otaviomachado3@yahoo.com.br
Quem
esteve ontem (10 out. 2012) a noite no auditório da Faculdade de Direito (FDR)
da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE) pôde ter o primeiro diálogo público com a Comissão da Verdade de
Pernambuco Dom Hélder Câmara.
A
sessão começou com a fala do Secretário-Executivo da Comissão Fernando Coelho, que teceu boas considerações
sobre a obra pioneira sobre os mortos e desaparecidos da ditadura civil-militar
de 1964. Em seguida, a apresentação sobre as organizações e partidos políticos
que sofreram perseguições nesse período foi feito pela Professora Socorro
Ferraz, que também apresentou a lista dos assassinados em Pernambuco ou de
pernambucanos vitimiados em outros Estados, listando, inclusive, organização
por organização.
É
óbvio que tudo não traz só lacunas, mas também ainda falta conteúdo para
identificar os mandantes e os executores dessas pessoas, o que motivou a
criação, a existência e a continuidade dos seus trabalhos.
Após
esse primeiro momento foi dada a palavra aos presentes. Um terma de consenso é
que a identificação de todas as redes de repressão é fundamental, inclusive os
seus “braços” na sociedade civil e além do Estado.
O
ex-preso político e sociólogo Cajá falou da necessidade de se tirar as calúnias
contra os opositores do regime de exceção dos documentos oficiais. Falou também
de alguns aspectos factuais que precisam ser considerados no resgate histórico.
O
militante dos direitos humanos, pesquisador e jornalista Marcelo Mário de Melo falou
das possibilidades reais de identificação dos membros do Comando de Caças aos Comunistas
(CCC), dando a deixa de que só um pouco mais de “vontade” da Comissão seria
suficiente para se chegar aos principais nomes desse famigerado aparelho
extra-intra estatal.
Marcelo
citou que o atual Senador Jarbas Vasconcelos quando era estudante universitário
testemunhou uma pichação de diversos
membros do CCC na Universidade Católica de Pernambuco, cujos principais nomes
ele poderia ceder gentilmente sem problemas para contribuir com o resgate
histórico, considerando que todos nós sabemos que a oportunidade não é para
caça às bruxas e sim a busca pela verdade. Seria fundamental convidá-lo a
relatar isso, considerando que Jarbas foi um militante contra ditadura naquela
ocasião e ocupa atualmente um importante cargo da República. Seria não apenas
um dever cívico, mas o exemplo de homem público comprometido com as iniciativas
estatais dar esse depoimento mesmo que privado à Comissão.
O
ex-Senador Marco Maciel, que ocupou diversos cargos políticos na estrutura do
poder estatal no período da ditadura civil-militar, também seria outro que
poderia ser convidado, porque a comissão precisa analisar no seu relatório o
poder estatal, o funcionamento das instituições e as redes de atores que
ocupavam importantes postos no período para que se possa ter a visão do Estado
por dentro.
Também
fiz uma fala no evento da Comissão ontem, indicando que é necessário convidar
todos os atores políticos daquele período mesmo que não estejam ligados
diretamente aos crimes. Sem a convocação de atores políticos que estavam na
máquina estatal, a Comissão da Verdade não será uma comissão de verdade. Talvez
de meias-verdades, de meias-histórias e que vai fornecer à sociedade uma
entrega de uma história embrulhada em papel de presente e florida, distante de
um aprofundado e necessário direito à memória e à verdade que muitos não só anseiam,
mas exige.
Outro
aspecto que sempre tenho considerado é que a Comissão da Verdade se faça
presente na vida dos pernambucanos até a entrega do relatório final, porque sem
isso ela não vai influir muito e nem deixar uma boa marca. É preciso uma
visibilidade permanente com a ocupação de vários espaços nas mídias, nos
eventos que podem tratar de temas do trabalho da Comissão e na permanente troca
com a sociedade de forma criativa e altiva.
A
comissão ainda não conseguiu criar aquilo que chamamos na metodologia da
pesquisa científica de “rapport”, ou seja, uma relação de confiança entre os
que fazem os levantamentos e os que podem efetivamente colaborar, o que a
própria composição de alguns dos nomes da Comissão pode criar impedimentos para
isso, sem contar a forma de tratamento dispensada a depoentes em sessões
públicas com piadinhas e ironias que expõe as pessoas a situações até
constrangedoras. É preciso corrigir urgentemente isso para que as colaborações
privadas.
Nos
slides apresentados me lembro de uma pequena correção que precisa ser feito. O
nome correto do grupo Colina é “Comandos de Libertação Nacional”, cujo fundador
e quem deu esse nome entrevistei anos atrás e pode exemplificar isso. O
depoimento de Apolo Heringer Lisboa está aqui: http://www.fpabramo.org.br/o-que-fazemos/memoria-e-historia/apolo-heringer-lisboa
Nos
nomes
de pessoas de organizações, também sugeriria a inclusão de Jacob
Gorender ali junto ao de Mário Alves. Ele foi fundador do PCBR e esteve
presente na reunião de fundação do grupo em Niterói ao lado do
pernambucano Bruno Maranhão. Seu depoimento será disponibilizado na
segunda edição do livro que organizei intitulado CONTRIBUTOS PARA O
PENSAMENTO
DAS JUVENTUDES BRASILEIRAS (Memórias), que inclusive tem depoimentos
importantes e ilustrativos, como o de Luiz Costa Lima (que foi dedurado
por
Gilberto Freyre), Elimar Nascimento (que ilustra bem a presença da Ação
Popular)
e tantos outros. Pode ser “baixado” aqui: www.slideshare.net/otavioluizmachado/livro-contributos-para-o-pensamento-das-juventudes-brasileiras-memrias-organizado-por-otvio-luiz-machado
Vou
tentar colaborar com a Comissão dentro das minhas possibilidades fornecendo
toda a documentação que coletei e deixando o acesso livre para todas as
entrevistas que fiz, que somam mais de 500 em todo o Brasil cobrindo
principalmente o período da ditadura civil-militar. Agindo assim posso estar
estimulando outros a colaborar, também.
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